sábado, 25 de fevereiro de 2017



Uma Aventura em Londres

6º Capítulo

Segurança

Apesar de andar na rua até à meia-noite ou uma da manhã, nunca senti insegurança exceto uma vez, quando um grupo de indianos me mandou uma moeda à cabeça na zona de Gloucester Road e me disse qualquer coisa em indiano que me deixou na mesma. Meti o rabo entre as pernas e passei a dar a volta por outro lado, não fosse a coisa repetir-se e pegar-se tudo à bofetada.
Um dos aspetos menos seguros tinha a ver, imaginem, com o facto de, ao atravessar a rua, os automóveis virem do “lado errado”. Em Portugal aprendi a atravessar a estrada olhando mais para a esquerda do que para a direita. Em Londres era, e ainda é, precisamente o inverso, já que as viaturas circulam pelo lado esquerdo da via. Era estranho aquele fluxo contrário e a atenção permanente ao “lado errado”.
Também em Piccadilly conheci uma fauna distinta: Os Punks. Tememos, por regra, o que é diferente e não compreendemos. Como não sabemos o que dali poderá vir, guardamos alguma distância não vá o diabo tecê-las. No início foi precisamente isso. Sentava-me pasmado de boca aberta a apreciar aqueles grupo com cabelos em crista de cores garridas, maioritariamente vestidos com roupas esquisitas, rasgadas, decoloradas e sujas, blusões de cabedal e botas negras, bebendo constantemente cerveja em latas de meio litro vendidas em pack’s de seis no indiano mais próximo. Tinham poiso certo na escadaria que rodeia a estátua do Cupido, local que qualquer aspirante a turista obrigatoriamente visita na cidade de Londres. Os japoneses já, à data, eram bem conhecidos pelo seu particular gosto em fotografar tudo o que mexe. Os punks eram dos alvos preferidos para estes fotógrafos de ocasião que também eram, reciprocamente, brindados com gestos de cortesia feitos com os dedos médios e olhares ameaçadores. Viram em mim um diferente e sempre que lá ia e os via toleravam-me, até pela minha idade e inocência, embora nunca tivéssemos interagido mais do que olhares de admiração e espanto da minha parte.
Entre a zona de Piccadilly e o Soho, existia a zona do “piolho”, onde os Peep Shows, Cinemas Porno e Casinos Manhosos com máquinas “caça niqueis” tinham presença maioritária. Também por aí me metia nas ruas e ruelas e em todos os sítios entrava, sem qualquer receio nas tardes folgadas, nunca à noite. Não tinha nada para roubar, exceto um velho Timex digital (daqueles chatos como a potassa que incomodavam tudo e todos nas salas de cinema) oferecido num qualquer Natal ou Aniversário. Passar às portas de todos estes lugares era parecido com o assédio dos funcionários dos restaurantes da antiga Feira Popular de Lisboa quando passávamos junto à sua entrada. Quase que nos arrastavam porta dentro. Passei longas horas a ver as máquinas que empurravam moedas, Slot Machines e máquinas de corridas de cavalos cheias de cores e sons peculiares. Era tudo novo para mim.
Bem perto de Piccadilly fica o Soho ou Bairro Chinês. Esta área é caracterizada por uma população maioritariamente chinesa com residências, comércio, serviços e restauração chinesa. É um mundo à parte, isolado e fechado sobre si próprio. É um país dentro de um outro país. Adorava passear pelas ruas e ruelas do bairro, visitando as lojas e, quando havia dinheiro, petiscar numa qualquer banca ou casa de comida desta população metida com ela própria. À semelhança do que acontece desde há uns anos em Portugal, Londres teve uma população chinesa mais presente desde mais cedo até por questões coloniais, nomeadamente pela presença inglesa desde há centenas de anos em Hong-Kong. Os cheiros são particulares, característicos, pujantes e omnipresentes. Vinte e dois anos depois senti os mesmos odores em Hong-Kong e na China continental, fruto de uma gastronomia própria e particular, recheada de produtos e condimentos próprios, onde se come tudo o que tem quatro pernas, exceto uma mesa de cozinha, dizem por graça na zona de Guangdong, província no sul da China contígua a Hong-Kong.
Na Beauchamp Place conheci o Carlos, filho de um guitarrista do Restaurante Fado vindo da zona do Laranjeiro e que andava muitas vezes por lá juntamente com o Ciro, sobrinho do Ciro da Pizzaria Pomodoro. Eram os dois meio passados. Numa noite de folga combinámos ir a uma discoteca perto de Portobello Road. O Carlos e o Ciro eram mais velhos do que eu cerca de meia dúzia de anos e tinham outro “andamento”. Nessa saída noturna percebi algo mais da noite Londrina, em sítios onde a “barra era mais pesada” e desmarquei-me por receio, depois dumas “raviengas” falhadas para entrar na discoteca sem pagar. Nunca senti realmente insegurança embora estivesse numa das maiores cidades do mundo. Filho de muita mãe aqui desaguou e continua a desaguar. Via-se de tudo.
Depois da aventura lá regressava, seguro, ao Imperial College, no 66 de Evelyn Gardens, perto do Royal Brompton Hospital.


Continua…  

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