Uma
Aventura em Londres
6º
Capítulo
Segurança
Apesar
de andar na rua até à meia-noite ou uma da manhã, nunca senti insegurança exceto
uma vez, quando um grupo de indianos me mandou uma moeda à cabeça na zona de
Gloucester Road e me disse qualquer coisa em indiano que me deixou na mesma.
Meti o rabo entre as pernas e passei a dar a volta por outro lado, não fosse a
coisa repetir-se e pegar-se tudo à bofetada.
Um
dos aspetos menos seguros tinha a ver, imaginem, com o facto de, ao atravessar
a rua, os automóveis virem do “lado errado”. Em Portugal aprendi a atravessar a
estrada olhando mais para a esquerda do que para a direita. Em Londres era, e
ainda é, precisamente o inverso, já que as viaturas circulam pelo lado esquerdo
da via. Era estranho aquele fluxo contrário e a atenção permanente ao “lado errado”.
Também
em Piccadilly conheci uma fauna distinta: Os Punks. Tememos, por regra, o que é
diferente e não compreendemos. Como não sabemos o que dali poderá vir,
guardamos alguma distância não vá o diabo tecê-las. No início foi precisamente
isso. Sentava-me pasmado de boca aberta a apreciar aqueles grupo com cabelos em
crista de cores garridas, maioritariamente vestidos com roupas esquisitas,
rasgadas, decoloradas e sujas, blusões de cabedal e botas negras, bebendo
constantemente cerveja em latas de meio litro vendidas em pack’s de seis no
indiano mais próximo. Tinham poiso certo na escadaria que rodeia a estátua do
Cupido, local que qualquer aspirante a turista obrigatoriamente visita na
cidade de Londres. Os japoneses já, à data, eram bem conhecidos pelo seu
particular gosto em fotografar tudo o que mexe. Os punks eram dos alvos
preferidos para estes fotógrafos de ocasião que também eram, reciprocamente,
brindados com gestos de cortesia feitos com os dedos médios e olhares
ameaçadores. Viram em mim um diferente e sempre que lá ia e os via
toleravam-me, até pela minha idade e inocência, embora nunca tivéssemos
interagido mais do que olhares de admiração e espanto da minha parte.
Entre
a zona de Piccadilly e o Soho, existia a zona do “piolho”, onde os Peep Shows, Cinemas
Porno e Casinos Manhosos com máquinas “caça niqueis” tinham presença
maioritária. Também por aí me metia nas ruas e ruelas e em todos os sítios
entrava, sem qualquer receio nas tardes folgadas, nunca à noite. Não tinha nada
para roubar, exceto um velho Timex digital (daqueles chatos como a potassa que
incomodavam tudo e todos nas salas de cinema) oferecido num qualquer Natal ou
Aniversário. Passar às portas de todos estes lugares era parecido com o assédio
dos funcionários dos restaurantes da antiga Feira Popular de Lisboa quando
passávamos junto à sua entrada. Quase que nos arrastavam porta dentro. Passei
longas horas a ver as máquinas que empurravam moedas, Slot Machines e máquinas
de corridas de cavalos cheias de cores e sons peculiares. Era tudo novo para
mim.
Bem
perto de Piccadilly fica o Soho ou Bairro Chinês. Esta área é caracterizada por
uma população maioritariamente chinesa com residências, comércio, serviços e
restauração chinesa. É um mundo à parte, isolado e fechado sobre si próprio. É
um país dentro de um outro país. Adorava passear pelas ruas e ruelas do bairro,
visitando as lojas e, quando havia dinheiro, petiscar numa qualquer banca ou
casa de comida desta população metida com ela própria. À semelhança do que
acontece desde há uns anos em Portugal, Londres teve uma população chinesa mais
presente desde mais cedo até por questões coloniais, nomeadamente pela presença
inglesa desde há centenas de anos em Hong-Kong. Os cheiros são particulares, característicos,
pujantes e omnipresentes. Vinte e dois anos depois senti os mesmos odores em
Hong-Kong e na China continental, fruto de uma gastronomia própria e
particular, recheada de produtos e condimentos próprios, onde se come tudo o
que tem quatro pernas, exceto uma mesa de cozinha, dizem por graça na zona de
Guangdong, província no sul da China contígua a Hong-Kong.
Na
Beauchamp Place conheci o Carlos, filho de um guitarrista do Restaurante Fado
vindo da zona do Laranjeiro e que andava muitas vezes por lá juntamente com o
Ciro, sobrinho do Ciro da Pizzaria Pomodoro. Eram os dois meio passados. Numa
noite de folga combinámos ir a uma discoteca perto de Portobello Road. O Carlos
e o Ciro eram mais velhos do que eu cerca de meia dúzia de anos e tinham outro
“andamento”. Nessa saída noturna percebi algo mais da noite Londrina, em sítios
onde a “barra era mais pesada” e desmarquei-me por receio, depois dumas
“raviengas” falhadas para entrar na discoteca sem pagar. Nunca senti realmente
insegurança embora estivesse numa das maiores cidades do mundo. Filho de muita
mãe aqui desaguou e continua a desaguar. Via-se de tudo.
Depois
da aventura lá regressava, seguro, ao Imperial College, no 66 de Evelyn Gardens,
perto do Royal Brompton Hospital.
Continua…
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